sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Taciturna









A escuridão a excitava. Gostava das sombras e de imaginar monstros sob a silhueta da lua.
Não tinha medo. Nunca teve. Conversava por horas com figuras imaginárias, criadas pelo jogo de luz e sombras no jardim.
Se havia névoa, melhor! Tudo parecia mais misterioso. Seu coração, então, disparava. Era tanto pra imaginar!
Cresceu assim: apegada à solidão. Amiga das fases lunares. Brincando de esconde-esconde com a neblina. Contando segredo às formas sombrias.
Ser estranho, canhoto, enigmático.
Mudou-se. Na cidade, perdeu o luar. As sombras eram traiçoeiras. Como agora imaginar? Onde agora se esconder?
Virou poetisa. Submergiu no mundo das palavras.  Oculta-se em metáforas, joga com antíteses, cria raras rimas.
O coração, de novo, dispara: ritmadamente!


Ser estranho, canhoto, enigmático...




sábado, 28 de junho de 2014

Por amor








Pediu perdão.
Ainda não sabia bem o que havia acontecido quando a porta bateu atrás de si. Como pudera?
Sentiu um misto de vergonha e desespero. Jamais seria a mesma. Não havia volta.
O coração doía como nunca. A porta fechada nunca mais se abriria. Sabia disso e isso era doloroso. Uma parte de sua vida tinha se desmoronado. Fato! Pela primeira vez riu de si mesma.
Fez questão de atravessar a rua na faixa.  Já havia se desviado demais!
Um vento morno anunciou mudança de tempo. Mudança! Irremediável mudança! O coração pareceu desmaiar dentro do peito. Não queria mudar. Vacilara, com certeza, mas todo mundo erra! Por que somente ela deveria sofrer tanto? Por que pra ela não havia perdão? Sentia-se só. Perdida. Por isso tomara o caminho errado. Por isso imaginou, por isso arriscou, por isso perdeu!
Teve vontade de voltar e novamente pedir perdão, mas sabia que não adiantaria. Repetiu, então, mentalmente, seu pedido de perdão tantas vezes quanto achou necessário. Desejou fortemente que a dor fosse somente sua.
Atravessou a noite querendo um ponto de restauração. O momento mágico em que a decisão ainda não tinha sido tomada.
Amanheceu sem forças com os olhos cansados de não dormir. Arrumou-se para encarar o dia e a nova vida que tinha pela frente. Vestiu-se de dignidade e respeito, armou-se de coragem e saiu.

Do outro lado da cidade, alguém amanhecia certo de que perdão fora feito pra ser concedido. 

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Nominal













Sou taciturna. Gosto de frio, neblina, chuva fria, barulho de vento. Sou olhar impedido por montanhas, manto de nuvens, música tranquila, poucos amigos... poucas palavras.
Sou azul límpido de céu de outono e de montes. Sou verde-escuro de matas e rios escondidos. Sou segredo sempre!
Sou preguiça gostosa pela manhã, sono tardio, noites com lareira, taça de vinho, filme... poesia!
Sou ansiedade, preocupação.
Sou calma, placidez.
Sorriso e riso... choro mudo.
Arrepio, maciez, perfume... sugestão!
Não sou. Nada!

Sou alegria. Disco, rock, soul... danço.
Movimento sempre. Sol quente janelas abertas alarido.
Descortino desvendo descubro revelo.
Às claras!
Segredo aos quatro ventos.
Sou horizonte amplitude devaneio tentativa e erro.
Pés descalços corte na pele aspereza.
Cheiro de vida gosto de sal!
Sem cera:
Inconfundível!
Sou toda, Sou uma